sábado, 28 de novembro de 2009

Prólogo - Meu Anjo

Os flocos caiam lentamente sobre o banco de madeira branco do parque. Era começo de inverno e única coisa que eu podia ver através da janela embaçada do meu quarto era a neve. Branca, pálida se destacando com o verde oliva da gramínea e do vermelho da gangorra velha do parque.
Meu primeiro contato com ele foi ali. Meus olhos encontraram uma figura escura e distante vagando pelo parque, arrastando os pés pela neve e desmontando a imagem que eu tinha do parque. Tudo nele indicava que ele não era daqui, e não pelo simples fato de ter o visto que comprovou isto, foi meu interior que sussurrava aos meus ouvidos, o meu instinto.
Ele vagou pelo parque por volta de meia hora, parecendo que procurava algo ou talvez apenas matando tempo. Seus ombros se elevaram um pouco para depois cair rapidamente de novo no seu lugar, demonstrando cansaço ou tédio, talvez os dois.
Por dois segundos ele encontrou meus estranhos olhos e observou, como se já soubesse que eu estava ali o tempo todo. Instintivamente eu me escondi atrás da cortina bege, assustada pelo flagra, mas a minha curiosidade foi maior que o meu medo. Lentamente eu escorreguei da cortina para a madeira da janela e depois para os vidros embaçados. E ali estava ele sentado no velho banco da praça, uma rua e duas calçadas de distancia de mim.
Seus olhos claros se chocaram com os meus, porém desta vez eu não me esquivei ou escondi, eu simplesmente fiquei parada em frente a minha janela absorvendo aquela imagem e ele fez o mesmo comigo, sem pestanejar. Como que se esperasse que entre aquela trocas de olhares quem desistisse fosse eu. Mas eu não faria isso, não mesmo.
Então as sensações voltaram a me cercar e me sufocar novamente, como sempre fazia quando eu começava a ouvir vozes-grossas, agudas, roucas, gagas, demoníacas e angelicais- ou quando eu começava a ver ‘estranhos’. Minha respiração diminuiu, meu coração golpeava cada vez mais rápido e minha visão mesclou de um turvo vermelho com preto. Eu fechei meus olhos por alguns segundos tentando voltar ao normal, ainda na frente da janela. Quando voltei abrir os olhos um clarão cegou meus olhos por treze segundos e então eu voltei a enxergar.
A neve ainda estava ali sobre o velho banco, a praça ainda estava empalidecida pelos flocos e a gangorra ainda estava parada, o único que não era o mesmo era ele.
Eu via definidamente todos os seus traços: Os olhos azuis claros cercados por uma íris preta azul-amarelada, seu corpo ajustada em seu casaco comprido preto, sua altura alongada, suas mãos grandes em forma de uma ‘delicada’ garra e suas imensas e afiladas asas negras.
As asas estavam abertas de uma forma confortável, como se não estivessem em seu esplendor. Mas de alguma forma elas ainda eram transparentes e fantasmagóricas, o que fazia com que elas se fundissem com o banco. Mesmo assim eram lindas, formadas com penas pretas que aos poucos e em pouca quantidade se desprendiam e se destacavam com a neve branca do chão. A figura de um anjo sentado a beira de um banco, em frente à janela do meu quarto, me observando e me confrontando como se disessi o que eu já sabia desde aquele momento: que ele era o Meu Anjo.
A escuridão voltou a fazer compahia minutos depois quando eu fiquei inconsciente. Eu tinha apenas 9 anos quando isso ocorreu, mas eu o veria por mais 7 invernos.







*Obs.: Próximo capitulo – 7 Invernos.