Moira ainda me encarava, com suas mãos na cintura, esperando que eu explicasse o que tinha acabado de acontecer. Eu ainda estava submersa, alheia a situação. Eu não acreditava no que Lucius tinha me dito. Você sabe por quê. E o que isso deveria significar pra mim?
- Então o que aconteceu? E que cara é essa? – Moira me perguntou impaciente.
Eu olhei para ela e me desfiz dos meus pensamentos.
- Vamos pra aula, ta? – eu torci que ela não tocasse mais no assunto, mas aí não seria a Moira que estaria na minha frente.
- Desculpa amiga, mas você vai ter que me explicar o que aconteceu aqui!
Eu revirei os olhos.
- Eu te conto... – peguei minha mochila, andei até ela e segurei seu braço, puxando-a para porta – no caminho. Agora vamos que a gente já ta atrasada.
Eu contei a história bem resumida. A ‘forte amizade’ entre a Luiza e Lucius, a forma como ela me tratou na quadra e como Lucius explicou a relação dos dois. Eu não contei a parte da Bianca e nem a frase do dia “Você sabe por quê”. Ela parecia curiosa, tanto quanto eu, sobre a amizade dos dois, mas eu sabia tanto quanto ela sobre o assunto. Nada.
Chegamos ao pátio. Ele era imenso, o piso era feito de pedras, mas era liso para o treinamento. Ao seu redor havia o lindo jardim. As flores divagavam entre margaridas, rosas, flores do campo e as tulipas. Em algumas partes havia bancos brancos de madeira – isso me lembrou vagamente o parque perto do orfanato. Não pense nisso.
Celina se aproximou de nós, mas dessa vez sem o Sam. Ele estava novamente conversando com Julio. Nós continuamos a conversa, já que Irial ainda não tinha chegado.
- Então temos uma nova vadia na área?! – Moira disse pensativa e calculista.
- Dados aos fatos, acho que sim. – eu disse
- Quem é a nova vadia da vez? – Celina brincou.
- Luiza Minogue – Moira respondeu séria.
- A Minogue?! – Celina perguntou incrédula.
- Você acredita que ela ta dando em cima do Lucius e ainda por cima brigou com a Claire por causa disso. – Moira contou como se fosse a melhor fofoca do ano. Talvez não fosse uma boa idéia ter contado pra ela.
- Brigou!? – Celina perguntou chocada.
Eu olhei para Moira por um instante, mas ela só deu de ombros.
- A Moira ta exagerando, Céu... – eu olhei duramente para Moira novamente e voltei a olhar a Celina – Foi mais uma discussãozinha do que briga.
- Você vai me contar tudo agora! – Celina praticamente soletrou “agora”.
Mas antes que eu tivesse tempo de explicar, Irial chegou. Moira parou de conversar imediatamente e olhou em direção a ele. Um sorriso espontâneo apareceu em seu rosto.
- Agora vocês me dão licença que eu tenho uma coisa muito importante pra fazer – ela sorriu maliciosamente para mim e para Celina e depois foi em direção a Irial.
Eu observei o andar calmo e pretensioso de Moira até Irial. Ela soltou seus cabelos rapidamente, passou os dedos entre eles enquanto caminhava, sorriu genuinamente e parou em frente a ele. Ele tinha a olhado por toda a caminhada, parecendo ter a mesma admiração que ela, mas de maneira disfarçada. Moira sorriu quando começaram a conversar e sorriu ainda mais quando encostou seus dedos no braço dele. Mas Moira tinha todas as razões para fazê-lo. Irial era um dos mais velhos entre as dominações, assim como Sura, mas diferente dela ele tinha as asas brancas. Eram lindas, suas asas estavam estendidas, em plena forma. Se seus olhos não mostravam todo o entusiasmo com a situação, bem, suas asas mostravam. Estavam um pouco agitadas, eu podia ver algumas penas pálidas se desprenderem no processo. Eu ri um pouco do que via. Talvez eu estivesse um pouco errada sobre o fato de Moira levar Irial para a festa de iniciação.
Irial riu de algo que Moira disse e eu pude notar as covinhas em seu rosto. Ele era tão alto quanto Lucius, seu cabelo era castanho escuro e um pouco bagunçado, seus olhos eram tão castanhos quanto seu cabelo. Ele sempre estava com barba para fazer, usava uma calça de poliéster preta e uma regata preta, assim como todos os principados. Sua regata deixava a vista seus braços, que tinha um modesto contorno de músculos, mas que combinava com sua estrutura. E o mais importante, combinava com sua habilidade: espadas.
- Ela nunca desiste. – Celina disse com os braços cruzados e a expressão divertida – Eu vou pegar minha espada Claire. Mas eu vou querer todos os detalhes depois dessa discussão com a Minogue.
Ela me olhou, se fingindo de brava, depois se afastou e foi até o suporte das espadas. Eu voltei a olhar a Moira que parecia ter acabado de conversar com Irial e também estava indo pegar sua espada. Agora era minha vez de conversar com Irial.
Eu caminhei ligeiramente até Irial, querendo não atrapalhá-lo em seu treino. Ele me viu chegar e sorriu um sorriso convidativo e simpático.
- Finalmente você veio treinar! – ele disse animado.
- Eu temo que não – eu disse um pouco envergonhada depois de todo aquele entusiasmo. Ele me olhou um pouco mais e esperou que eu explicasse – Eu não estou me sentindo muito bem hoje e com um pouco de dor de cabeça. Eu queria ser dispensada da aula hoje. Posso?
- Eu vou dispensá-la hoje, mas só porque você é do segundo nível e deveria estar em outro treino e não no meu. – ele cruzou os braços e chegou um pouco mais perto – e também porque você acabou de ter um treino com o Lucius e bem, isso já explica sua dor de cabeça.
Eu não pude segurar a risada espontânea que saiu da minha boca. Eu não podia culpar a Moira de gostar desse cara, ele parecia inteligente e engraçado. Uma combinação atraente demais para uma pessoa só. Eu sorri para ele e agradeci. Ele acariciou rapidamente meu braço, se despedindo e virou para o resto da turma que já estava esperando para começar o treino.
Eu me afastei da turma e me sentei embaixo de uma das grandes árvores que tinha no jardim. Era um pouco distante do pátio, mas ainda assim eu podia ver o treino. Os principados giravam suas espadas no ar, em gestos sincronizados, copiando os mesmos gestos que Irial fazia. Moira parecia a mais empenhada da turma, ela girava e cortava o ar com graciosidade e perfeição. Sam não ficava para trás, enquanto Celina não parecia tão confiante assim, ela sabia fazer a combinação de gestos melhor que a maioria.
Mas eu não prestava tanta atenção assim no que eles estavam fazendo. Minha mente ainda estava no refeitório e nas palavras de Lucius. No momento em que ele as disse a única coisa que veio a minha cabeça era que aquilo era uma forma estranha e indireta de dizer que gostava de mim. Mas sabendo como Lucius era eu sabia que poderia ser outra coisa.
Eu passei praticamente um ano e meio em coma e depois um ano em recuperação e reabilitação. Eu tinha recuperado todos os meus movimentos e conseguido seguir com as aulas, mas eu não tinha recuperado minha memória totalmente. Principalmente as memórias mais próximas ao acidente. Eu não me lembrava de nada do acidente, como eu tinha parado no meio da avenida, quem havia me atraído ate ali ou quem tinha tentado me matar. Mas não envolvia só o acidente. Eu não me lembrava muito do que tinha acontecido entre eu e Lucius um pouco antes do acidente. Às vezes essas lembranças vinham em forma de sonhos ou visões em plena luz do dia, mas eram raras e nem sempre claras. Elas não tinham nenhum contexto ou eram lembranças aleatórias, então eu não as entendia muito bem. E o mais provável era que “Você sabe por que” envolvia isso, o meu passado. Porém, como sempre, Lucius era enigmático demais para falar alguma verdade inteira ou me esclarecer algo. E como sempre eu ficava a deriva da minha própria vida.
A dor de cabeça aumentou e eu me levantei, mantendo minhas costas encostadas no tronco da árvore e observando o treino. Todos continuavam a deslizarem suas espadas no ar, montando lutas imaginárias e carregando o peso da espada e o sonho de uma futura vitória. Eu ri um riso contido. Era a vez de carregar o peso da minha vida e correr atrás das minhas próprias vitórias.
- Você não vai jantar com a gente? – Celina perguntou aborrecida, depois de eu negar pela terceira vez.
- Não Céu. Eu to sem fome e com dor de cabeça, mas amanha eu te conto tudo que você quiser. – Eu sorri para ela. Ela retornou meu sorriso com a promessa que lhe fiz.
- E também eu posso te contar tudo Céu, sem problema algum – Moira disse sorrindo, mas eu sabia que ela estava cansada depois o termino do treino.
- Nem se atreva! – eu disse brincando – Além disso, eu posso contar detalhes que você não sabe.
Eu ri da expressão curiosa de Moira, mas eu me despedi antes que elas fizessem mais perguntas. Eu deixei o refeitório e fui para a quadra. Depois atravessei a área das piscinas e entrei no meu novo dormitório. As luzes estavam apagadas, denunciando que não havia ninguém ali. Andei pela pequena sala e fui para o meu quarto. Peguei minha toalha e fui ao banheiro, tomar banho. Água quente correu minhas costas, relaxando o meu corpo, ensaboei-me lentamente, tentando dissolver todo meu estresse, lavei meus cabelos em um processo lento e demorado. Escovei meus dentes e sai do box. Me enxuguei e fui novamente ao meu quarto. Eu sabia que não era a decisão mais sábia a se tomar, mas eu precisava sentir a água da piscina sob meus pés. Por isso coloquei meu biquíni branco com listras azul marinho e me enrolei na toalha de praia que eu tinha ganhado de Celina um tempo atrás. Ela era maior que as outras e por isso tampava completamente meu corpo. Eu saí do dormitório, percebendo que Lucius ainda não tinha chegado, e cheguei à piscina maior.
Estendi minha toalha sobre a beira da piscina e me sentei ali. A água morna atingiu meus pés quando os coloquei na piscina. Eu poderia sentir toda a minha frustração se esvair com esse pequeno gesto. Era assim que eu me sentia quando eu fazia reabilitação aqui, calma e tranqüila. E desde então, quando eu queria um refugio do mundo real, eu vinha para cá, meu pequeno mundo azul-piscina. Eu fechei meus olhos e arqueei minha cabeça para trás, me apoiando com os meus braços. Eu senti uma pequena brisa se arrastar pelo espaço e com isso uma voz soou perto de mim.
- Claire – uma voz masculina me falou. Eu abri meus olhos e vi a pessoa que me encarava, com ar encantado.
- Jeremi!? – eu me sentei de forma que eu pudesse olhar Jeremi melhor. Ele sorriu e vi covinhas se formarem em seu rosto – Jeremi! Senta aqui.
Eu bati na toalha, em um espaço ao meu lado, o convidando a sentar ao meu lado. Ele não hesitou e sentou no lugar que eu tinha lhe mostrado. Já ao meu lado, ele olhou das pontas dos meus pés até o meu rosto.
- Eu já lhe disse como você fica linda em um biquíni? – eu assenti em resposta, rindo, me lembrando quando ele me fazia esse mesmo elogio quando treinava na piscina com Camille na reabilitação – Então eu vou dizer de novo. Você fica linda de biquíni, menina dos olhos estranhos.
Eu me senti encolher um pouco sobre a toalha, me sentindo envergonhada. Mas Jeremi era assim sempre e com todas. Foi ele que me deu esse apelido “menina dos olhos estranhos” e como um vendaval, tinha se espalhado por todo o Instituto. Claro que nem todos me chamavam assim, mas a maioria sim.
- Então o que você veio fazer aqui? – eu disse tentando trocar o tema do assunto.
- Conversar com você, não posso? – ele fingiu estar ofendido. Eu ri e bati em seu ombro.
- Claro que pode, mas eu te conheço Jeremi. Sempre tem um motivo. – eu arqueei minha sobrancelha, lhe pressionando a dizer a verdade.
- Mas eu sou tão previsível assim? – eu revirei os olhos pelo comentário – Ta bom vou dizer logo. Preparada?
Eu assenti a cabeça um pouco hesitante.
- Você quer ir comigo no baile de iniciação? – seu sorriso quebrou um pouco vendo minha expressão. Eu estava lisonjeada, mas sabia que não era tão fácil assim.
- Jeremi – eu passei uma mexa de cabelo atrás da minha orelha – eu realmente queria ir com você, mas você também é um iniciante e nós não podemos subir no palco juntos. Tem que ir um de cada vez você sabe. E também tem sua família que não ia ficar nem um pouco feliz de ver você trocar um deles por mim.
Ele deu um sorriso turvo e isso me fez por um momento me arrepender de ter dito não.
- Mas é por isso que eu to te chamando para ir comigo. Minha família não vai poder vir, então eu pensei que talvez como você não tem família e como a minha não vai vir, a gente poderia ir junto. – Foi nesse momento que o meu coração se apertou.
- Eu também queria ir com você Jeremi, mas não daria certo com toda aquela disciplina e regras do Conselho, não ia ser muito bom entrarem dois iniciantes de uma vez e estragar toda uma tradição do Instituto – eu pôs minhas mãos sobre a dele – e você poderia ir com a Moira.
- Eu já falei com ela – ele disse todo carrancudo – Mas na cabeça doentia dela, ela vai com Irial no baile. Foi aí que ela me disse que você iria sozinha e que eu deveria ir com você.
Minha culpa amenizou um pouco com o que ele disse.
- Então quer dizer que eu sou sua segunda opção? – eu disse um pouco brava.
Ele me encarou sério – Você sempre será minha primeira opção e só me dizer quando e como que eu farei qualquer coisa para tê-la.
- Cala boca Jeremi – então nós dois rimos enquanto ele tentava me abraçar numa tentativa de pedir desculpas. Eu me afastava, mas eu estava mole com tanto que eu ria.
Nesse instante eu vi um vulto atravessar o vão da parede de vidro, que dividia a área das piscinas do ginásio. O vulto ganhou nome quando se aproximou mais. Lucius.
Ele nós observeu de longe com uma cara séria, mais séria que o normal. Ele passou do nosso lado, enquanto o olhávamos em silêncio. Mesmo com certa distância eu pude ver uma de suas mãos fecharam fortemente, denunciando sua raiva. Ele entrou no corredor lateral e sumiu de nossas vistas. Eu voltei a olhar a Jeremi.
- Eu acho melhor eu ir indo. – eu disse um pouco preocupada.
- Eu entendo – Jeremi simplesmente disse. Ele se levantou e eu o segui, me levantando e pegando minha toalha do chão. Me enrolei nela novamente e olhei Jeremi novamente.
- Até mais – eu me aproximei e beijei seu rosto.
Ele me segurou em um abraço rápido e também se despediu. Eu o vi se afastar através do vidro embaçado que separava o ginásio e sair pela porta dupla. Eu fui andando calmamente até o corredor e avistei a porta do dormitório. Ela ainda estava um pouco aberta, em um sinal que ele me esperava. Eu a abri lentamente, entrei no dormitório e a fechei. Eu já tinha visto Lucius, que estava de costas para mim, encarando o chão. Ele se virou para mim e eu pude ver seu rosto fechado e tencionado.
- Você nunca mais vai falar com ele. Não sozinha – sua voz aumentou consideravelmente.
E toda a tranqüilidade que eu tinha conseguido se foi.
- Você ta falando sério? – eu o olhei duramente e pude perceber que ele ainda estava com raiva – Eu vou ter que repetir o que eu te disse mais cedo? Você não manda na minha vida Lucius e não vou parar de falar com um amigo meu por sua causa.
Ele se aproximou perigosamente de mim. – Não mando em você? Você acha que eu to me referindo a você de forma possessiva? Eu to tentando é te proteger, garota! Mas parece que você não entende isso.
- E porque eu deveria entender, an? – eu bati minha mão em seu torço – Você mal me explica as coisas que aconteceram e eu deveria entender?
Ele permaneceu em silêncio, mas eu continuei despejando tudo que eu sentia – Você me fala que eu deveria saber o porquê, mas mal fala comigo. Todo mundo parece saber algo de você menos eu. Me trata como se eu fosse qualquer uma... Pior, como se me odiasse, então de uma hora para outra era como se nada tivesse acontecido, como se ainda estivéssemos no orfanato. Isso por que, me fala, por quê?
Eu gritei para ele. Eu senti as lágrimas escorrerem no meu rosto, quentes e cruéis. Lucius ainda me encarava, com a mesma raiva.
- Pelo menos se você se esforçasse mais, Claire, mas não... – ele parou como se não tivesse coragem de continuar.
- Agora a culpa é minha?! – eu gritei enquanto as lágrimas aumentavam – Claro que é minha. E sempre mais fácil se ausentar do que encarar a verdade, ne Lucius?
Ele segurou meu rosto entre suas mãos e me disse em um sussurro – Você acha que eu me ausento da culpa, Claire? Eu a encaro todos os dias e você não sabe como isso me dói.
Eu não consegui dizer mais nada depois disso. Nós ficamos em silêncio enquanto ele ainda segurava meu rosto. Ele me encarava e eu podia sentir através do seu toque que ele tentava me dizer algo com aquilo. Ele baixou suas mãos e pareceu amaldiçoar tudo que havia acontecido. Ele começou a sair, mas eu o impedi segurando sua mão. Ele me olhou em uma última tentativa de falar comigo.
- Só me fala por quê? – minha voz saiu rouca e baixa.
- Você deveria saber o porque, você já soube um dia. – seus olhos estavam tristes e em sua voz eu pude notar dor e magoa.
Assim ele me deixou na sala, se trancando em seu próprio quarto e me deixando mais frustrada do que antes. Eu encarei a porta de seu quarto. Eu queria gritar, berrar e dizer tudo que ainda estava entalado na minha garganta, mas já era tarde e eu tinha que dormir. Eu andei até o meu quarto, um pouco entorpecida, me deitei sobre o meu lençol, ainda de biquíni e deixei que o sono tomasse conta de mim. Futuramente eu saberia o porquê e seria da forma mais dolorosa.
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Eu encarava o teto do meu quarto, podia sentir o cheiro amadeirado dele enquanto ele me embalava entre seus braços. Eu me sentia protegida e confortável ali. Ele era o único que me entendia e que eu realmente amava. Ele pegou uma das mexas do meu cabelo e brincou entre seus dedos. Nós estávamos deitados em minha cama, fingindo que acima de nós tinha um imenso céu estrelado submerso em um azul-anil. Era sempre assim quase todas as noites. Ele me protegia dos outros e principalmente de mim mesma. Eu não podia demonstrar meus medos para o orfanato, se não seria considerada louca. Então ele sempre estava ali me afastando dos meus ataques e me mantendo firme. Era só com ele que eu poderia ser eu mesma e alguns momentos ser feliz.
Ele beijou minha têmpora e sussurrou em meu ouvido:
- Eu tenho que ir – ele disse carinhosamente.
- Mas já? – eu disse um pouco emburrada. Eu me sentei e o encarei de volta. Ele sorriu de jeito presunçoso e convencido. Eu bati em sua barriga. Ele se encolheu, fingindo sentir dor.
-Idiota! – eu sibilei para ele.
Ele se sentou na minha frente, pegou uma mexa de cabelo que estava em meu rosto e passou atrás da minha orelha. Ele deixou sua mão assim, acolhendo meu rosto e acariciando minha bochecha com seu polegar.
- Eu sempre vou deixar um pedaço meu com você, menina dos olhos estranhos, sempre. – ele soou calmo e carinhoso.
-Eu sei Lucius. – e como sempre eu encontraria um pedaço dele ao meu lado no outro dia, uma tulipa negra sobre o lençol, perto do meu coração.
Eu abri meus olhos lentamente. Minha cabeça doía e eu podia sentir que meus olhos estavam inchados. Todo mundo perceberia que eu estive chorando, mas eu não me importava. Eu me virei sobre o colchão e senti algo espetar minhas costas. Minhas mãos foram ao encontro dela espontaneamente. Eu já sabia o que era quando a peguei. Meus olhos encaravam novamente a mesma lembrança que Lucius sempre me deixava. Uma tulipa. Ele parecia pedir desculpa de alguma forma, mas eu não o perdoaria tão facilmente. Eu peguei a tulipa, me levantei da cama e fui até minha escrivaninha, abrindo uma de suas gavetas. Eu deu uma última olhada na flor que estava em minhas mãos. Ela era negra, assim como as asas de Lucius fora um dia, mas hoje a única coisa que ela me lembrava era como eu me sentia. Triste, negra por dentro. Eu coloquei a tulipa dentro da gaveta e a fechei. Eu estava atrasada de novo, eu notei ao olhar no relógio e pior, para aula da Luiza. A última coisa que eu queria fazer era encarar aquela vadia, mas eu não tinha muitas escolhas.
Eu entrei na aula tentando não chamar a atenção, mas Minogue não estava disposta a deixar isso acontecer. Ela parou a aula no momento em que eu abri a porta.
- Senhorita Bauer, chegando atrasada de novo? – todos olharam para mim. Eu odeio essa mulher – Eu não vou perdoar todos seus atrasos como a Helena, mas dessa vez eu vou deixar passar. Pode se sentar.
Ela apontou uma cadeira bem próxima a ela. Eu me odiei por chegar atrasada, ela me torturaria até o final da aula. Já não bastava o que eu tinha passado ontem. Ela retomou a aula enquanto em me dirigia a minha mesa.
- Como eu dizia, antes de ser interrompida, os Nefilins se dividem em cinco grupos: anjos caídos, demônios, vampiros, djins e elfos. Sendo que todos derivam apenas de um grupo: As dominções ou no termo usado pelos humanos, anjos. Todos já sabem a história original, assim como a Helena já tinha falado, tudo começou com Lúcifer e sua vontade de se tornar tão poderoso como Deus. Devido a isso ele foi expulso dos céus. Mas o que nem todos sabem é que ele não foi mandado ao inferno, que de fato nem existe, e sim para viver entre os humanos como igual. Sem seus poderes ou asas. Ele foi considerado um anjo caído. Mas ele não foi o único a ser expulso do céu. Com o passar do tempo Lúcifer começou a juntar um grupo de anjos caídos e formar uma espécie de batalhão, que alto se denominava “Corte Negra”. A partir daí muitas coisas acontecera. Deus, para punir esse grupo, ordenou que todos os anjos caídos fossem mortos pelos Dominações, anjos que a partir daquele momento viveriam na terra e exterminariam esse perigo. Porém as coisas não foram tão fáceis como se imaginava, muitos conseguiram fugir e se esconder, e pior, usavam os humanos como escudo. Em última tentativa Deus condenou todos os anjos caídos que se associassem a “Corte Negra” a uma pós-vida: ele andaria como os mortos e sua pele seria tão branca como um cadáver, ele não comeria mais e se alimentaria da podridão humana. Foi assim que se originaram os demônios, criaturas que sobrevivem do mau e assombram aqueles que se envolvem com o submundo. Mas o importante é saber que nem todos os anjos caídos se transformam em demônios ou estão associados a “Corte Negra”. Alguns realmente queriam viver entre humanos, por inveja ou curiosidade, e acabavam sendo expulsos por isso. O que mais intriga a todos é que não podemos ver a transformação de um anjo caído em demônio, apenas um tipo de pessoa pode notar essa transformação: os Blinds. – ela olhou para mim e sorriu – Mas isso eu falarei na outra aula. Por agora leiam os próximos capítulos do livro, Nefilins e suas derivações, porque na próxima aula eu falarei de Demônios, vampiros e o livro de Enoque. Agora vocês estão dispensados.
Todos a olhavam um pouco perplexos pela aula e por ela ter nós dispensado tão cedo. Eu nem contestei, me levantei e peguei minha mochila. Alguém cutucou minhas costas. Eu me virei e dei de cara com a Minogue
- Eu posso falar com você Claire? – ela perguntou educadamente.
Eu pude ver que Moira e Celina, que estavam atrás da Luiza, olhavam a cena um pouco chocadas. Moira tentou se sentar na cadeira novamente e escutar a conversa, mas Celina a impediu e a empurrou para porta. Eu ri, mas disfarcei.
- Sim – eu disse não disfarçando meu temperamento.
Ela sentou em sua cadeira, na frente do quadro negro. Eu puxei uma cadeira e me sentei a sua frente.
- Então... –eu disse. Ela parecia tão desconfortável como eu.
- Eu queria te pedir desculpa pelo meu comportamento de antes. – eu encarei novamente tentando digerir suas palavras. Quem era essa mulher na minha frente?
- Pela grande amizade e consideração que eu tenho com o Lucius – ela continuou – ele me pediu para te pedir desculpas...
Eu me levantei subitamente, entendo o porquê das suas desculpas. – Se for assim nem precisa me pedir desculpas, Luiza – eu disse zangadamente.
Ela suspirou e se deixou encostar na cadeira.
- Melhor assim. Então quando o Lucius for falar com você fala para ele que a mal educada é você e não eu.
- Aaah! Claro - eu disse ironicamente. Eu tentei sair, mas ela me impediu.
- E mais uma coisa – ela sorriu abertamente – Se eu não tenho alguma coisa com o Lucius agora não significa que eu não possa ter.
Agora sim a vadia que eu conhecia. Eu pensei seriamente em bater na cara dela, mas eu me contive e continuei a jogar o jogo dela. Eu sorri para ela calmamente e acenei, me despedindo sem dizer nada. Eu deixei que ela ganhasse essa, porque brevemente eu tiraria aquele sorrisinho da cara dela.
Meninas fiquem atentas pq os próximos caps vão ser tensos, viu! ;*
ResponderExcluirAhh Deus Meu !! Perfeito o Cap. !! ;D Quero maiss *-* ... Ky quando vc pode postar mais ???!
ResponderExcluirEspero que logo .. pq a Curiosidade ta apertando aki *-*
OMG!! tenso tenso!! adorei!
ResponderExcluirqueroo mais! *-*
Adoreiii !!!!
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